segunda-feira, 20 de dezembro de 2010

Infraero ANAC e TAM tratam idosos e deficientes como gado

Fico imaginando como será a vida de quem for usar avião durante a copa do mundo em 2014. Se já vivemos um verdadeiro caos cada vez que precisamos usar os aeroportos agora, na copa, com quase um milhão de turistas na terra Brasilis, será mais fácil viajar de jegue.
Aliás, a Infraero a ANAC e a TAM já tem experiência de sobra para lidar com esse tipo de animal. Refiro-me aos jegues, parentes dos cavalos, primo das vacas. Para quem acha que estou exagerando, conto o que se passou comigo, em Congonhas, no fim de semana passado.
Fui convidado a participar da cerimônia de premiação do IV Concurso literário da UFF (Universidade Federal Fluminense) que aconteceria no campus da universidade em Niterói. Os organizadores do concurso foram extremamente gentis e carinhosos e ofereceram transporte aéreo e hospedagem aos finalistas do concurso. Fui.
Cheguei ao guichê da minha companhia aérea para fazer o chéquim, já que o chequão a gente faz quando compra a passagem. Solicitei uma cadeira de rodas. Fui prontamente acomodado numa cadeira, é verdade que tive que dar uma reboladinha para fazer meu quadril passar entre os braços da cadeira. Não é meu quadril que é largo, era a cadeira que era ridícula. O atendente tirou-me da região do chequim e colocou-me num canto, a parte. Fiquei incomodado com a solução e tratei de procurar as rodas da cadeira com as mãos a fim de me movimentar e sair daquela posição de escanteio na qual fui colocado. Apalpo daqui, apalpo dali e surpresa: não encontro roda alguma. A cadeira de rodas não tinha rodas, pelo menos não aquelas rodas grandes que emprestam o nome à cadeira de rodas. Estava devidamente deixado de lado e sem possibilidade de me locomover caso fosse totalmente dependente de uma cadeira de rodas. Ergui-me da cadeira e levei meus documentos indispensáveis ao tal chequim me apoiando em minha bengala.
Feito o chequim um funcionário da companhia aérea, muito solícito, transportou-me, naquela cadeira, até ao local do embarque. Após passar pela revista fui levado até uma espécie de baia, cercada por cordas de isolamento. Era um retângulo de aproximadamente 3x10 metros. Estacionou minha cadeira e me orientou a aguardar o embarque que ocorreria dali a umas duas horas. Na minha frente quatro ou cinco senhoras idosas e um senhor também idoso. Todos desacompanhados aguardando o embarque. A tal baia ficava bem no meio da passagem dos cidadãos “normais”, era uma espécie de mostruário ou vitrina de invalidez, por idade ou por motivo de saúde no meu caso.
Como ainda faltava muito tempo para o embarque decidi locomover-me pelo saguão, dar um rolê, bisbilhotar uma livraria, beber um café expresso e esse tipo de coisa que fazemos em aeroportos enquanto esperamos nosso embarque.
Ato-falho levei as mãos à lateral da cadeira em busca das rodas. Ôps, que idiota! Tinha me esquecido. Levantei-me, desencaixei o quadril com certo esforço, a cadeira levantou junto, mas logo cedeu e soltou-se das minhas ancas estreitas. Peguei minha bengala e nova surpresa: não tinha saída naquele retângulo cercado por cordas. Sob os olhares incrédulos dos demais confinados, liberei a corda de um dos lados do retângulo quando fui abordado por uma funcionária da companhia aérea:

- Pois, não, o que senhor deseja?

- Eu desejo tomar um café, passear e principalmente sair dessa baia aberta à visitação pública na qual fui colocado.

- Desculpe...

Como a funcionária não me entendeu fui mais direto e conciso:

- Quero sair daqui.

- Ah, mas o senhor não pode...

Nem deixei completar as balelas que iria dizer:

- Claro que vou sair, você deve estar maluca.

- Mas a passagem do senhor ficou com o funcionário. Os passageiros especiais têm que esperar aqui.

Espichei o pescoço para dentro do balcão e vi uma passagem, num ato de rebeldia, meti a mão lá dentro, peguei a passagem – depois conferi e constatei que de fato tratava-se da minha passagem - e sob o olhar estupefato da funcionária, liberei a corda de isolamento e, antes de recolocá-la no lugar, olhei para meus companheiros de vitrina da invalidez como que os convidando a um ato de rebeldia. Ninguém se mexeu. De certo haviam sido bem orientados. Rompi os grilhões da Infraero. Estava livre. Caminhei e lá de fora pude contemplar a cena medonha daqueles senhores expostos à visitação pública, ilhados, confinados num cercadinho como se fossem bebês ou pior, como se fossem porcos ou vacas num curral.
Então isso é tratamento especial? Esse povo precisa tomar vergonha na cara.
A tempo: embarquei, compareci a cerimônia de premiação e fui classificado em primeiro lugar no concurso de contos.